Entrevista com a ilustradora Alice Masago
Ana Cláudia – Entrevistamos a Alice Masago, ilustradora incrível que tanto nos ajudou no inicio da criação da Ave Casa Editora. Alice, muito obrigada por tudo. Por favor, comece falando de você para nossos leitores, sua formação e seus principais trabalhos.
Alice: Sou Alice Masago, mineira de Belo Horizonte, formada em Artes Visuais com ênfase em Artes Gráficas pela Escola de Belas Artes da UFMG. Atualmente faço continuidade de estudos em Gravura, dentro do mesmo curso e da mesma instituição. Meu trabalho é voltado para a área da ilustração, escrita e produção gráfica de livros, onde pude escrever e ilustrar meu primeiro livro que intitulei de A ternura pelo avesso (2015) assim como, O manual do pombo-correio (2017) e um inventário de palavras compostas (2018). Atuo também como ilustradora para outros escritores e para alguns outros projetos. Em 2019 fui selecionada para o 10° Catálogo Íbero América Ilustra, do México, tendo os meus desenhos expostos na Feira Internacional do livro de Guadalajara (FIL).
Ana Cláudia – Nossa que maravilhoso Alice. E como seus pais lidaram com isso?
Alice: Eles sempre me apoiaram muito na minha escolha e sempre admiraram muito tudo o que eu fazia e toda minha trajetória desde que comecei a me envolver no meio artístico. Acredito que o apoio da família para quem escolhe ser artista é crucial, pois é uma área que apesar de linda é também de muita labuta para ser reconhecida e valorizada, ainda mais no mercado de trabalho. Então acredito que quanto mais apoio, mais força temos para seguir em frente e não desistirmos de algo que amamos tanto fazer.
Ana Cláudia – Quando surgiu o desejo e a vontade de desenhar em sua vida?
Alice: Desenho desde muito nova, mas comecei a desenhar com intenção de ser artista com 9 anos de idade. Tenho em minha família pessoas que possuem aptidão para o desenho e para o desenvolvimento de trabalhos manuais, apesar de não atuarem na área. A influência de meus familiares, como meu avô e minha mãe, me introduziu no mundo da arte de uma forma muito bonita, fazendo com que eu atentasse o meu olhar para as coisas à minha volta. Eu tentava ao máximo perceber cada detalhe das coisas do cotidiano e transformá-las em desenho e até mesmo em poesia, e assim aprendi a desenhar observando, e posso também dizer que aprendi a desenhar desenhando, pois o amor pelo desenho fazia com que eu me dedicasse dia após dia a esse fazer, e com o passar dos anos eu pude ir percebendo que o meu desenho evoluía por conta da minha insistência de estar sempre ali com um lápis e um papel na mão, ansiosa por gerar uma imagem nova e encantada pelos traços no papel. Tudo aquilo para mim era mágico.
Ana Cláudia – E é realmente mágico! Seu trabalho é lindo! Então seu avô e sua mãe também desenham?
Alice: Ah obrigada! Sim, meu vô foi pedreiro por muitos anos, depois aposentou e parou de trabalhar na área, mas ele tinha dentro do maleiro do guarda-roupa um caderno onde ele desenhava casas e coloria tudo muito bonitinho, então eu passava o dia inteiro folheando e olhando o caderno dele, achando aquilo tudo incrível. Ele desenhava do jeito dele, mas desenhava! E era tudo muito certinho e alinhadinho. Na minha memória foi o primeiro contato que tive com os desenhos de alguém da família e que me impulsionou a querer desenhar também. Mas minha mãe também desenhava e ainda desenha, hoje menos do que quando eu era mais nova, mas ela ainda gosta muito de desenhar. Mas me lembro mais dela pintando pano de prato, pintando frutas e jarros, e a minha vó hoje em dia também pinta. Sinto que é algo que eles tomam como uma atividade para espairecer a cabeça, mas no meu caso eu acabei adotando como profissão.
Ana Cláudia – Que história incrível!!! Mostra pra gente como a família, mesmo sem perceber, tem influência sim em nossas escolhas neh?! Em relação ao desenho, qual a sua maior inspiração?
Alice: Me inspiro muito em histórias em quadrinhos e tirinhas, pelo desenho e narrativa. Elas me ajudam muito a entender como se dá o desenrolar de uma história e de como fazer o desenho falar, criando ali um acontecimento que seja captado no primeiro instante. Admiro muito o trabalho do Quino com a Mafalda e de um ilustrador incrível, também argentino, que se chama Ricardo Liniers, ambos me trazem, a todo o tempo, motivações para imaginar o inimaginável e inserir nos meus desenhos e narrativas o máximo de poesia e delicadeza possível. A literatura também me inspira e meus maiores aliados são Mário Quintana, Manoel de Barros e Clarice Lispector.
Ana Cláudia – Grandes inspirações Alice! E como você se prepara para desenhar? Existe um ritual antes dos traços ou você só senta e começa a desenhar?
Alice: Quando não tenho uma encomenda e preciso desenhar sem nenhuma proposta inicial eu tento seguir o que estou sentindo. Desenho muito por intuição, e meu desenho muitas vezes costuma refletir como estou, assim como um espelho. Não tenho um ritual para desenhar, o desenho vem quando ele quer e quando chega uma ideia, e sinto que ele acaba se tornando um meio de expressão muito sincero e libertador para mim, por ser algo que eu não consigo forçar. Mas quando tenho uma encomenda, o desenho surge a partir do que o cliente demanda e está pensando, assim, somo as minhas ideias às ideias dele, transformando tudo em uma arte final.
Ana Cláudia – Alice, podemos dizer que existe uma forma correta de desenhar?
Alice: Não. O desenho é algo muito livre assim como a arte num todo. Não existe um desenho certo e um desenho errado, existem as técnicas e todos os procedimentos que uma pessoa que está querendo começar a desenhar ou que já desenha pode seguir, mas isso não significa que ela tenha que seguir. O desenho é algo muito pessoal, e existem inúmeras formas de se desenhar e acho que, a seu tempo, cada um encontra a sua forma, e acredito que isso é o que, de mais belo, a arte nos apresenta, que são as particularidades de cada artista e de cada traço.
Ana Cláudia – Qual dica você daria para quem gosta de desenhar, tem dúvidas da carreira, ou está no início dos estudos?
Alice: Para quem gosta de desenhar aconselho a não parar, pois é na prática que a gente se molda e se fortalece, e se for algo que a pessoa goste muito e queira levar para frente que ela invista nisso, busque informações sobre o fazer artístico, converse com quem já exerce a profissão, encontre suas referências, pois é nesse momento que você começa a perceber onde você se encontra e qual é o seu estilo. Pois conseguimos entender quem somos a partir do que gostamos, então as referências no momento que se está começando a desenhar são muito importantes. Quando estamos começando a estudar tendemos muito a adotar um estilo parecido com o dos artistas que a gente gosta até conseguirmos encontrar o nosso, e esse primeiro encontro é que traz amadurecimento e que nos dá embasamento para elaborarmos mais para frente as nossas próprias questões. Quanto às duvidas de carreira, acredito que para ser artista e fazer arte, antes de mais nada é preciso amar muito tudo isso, pois é o que te sustenta no percurso, e se entregar aos processos, aos aprendizados e até mesmo às dificuldades, que fazem parte da formação de todo artista. É uma profissão que exige muito esforço emocional, mental e físico, mais ao mesmo tempo é muito satisfatória e recompensadora.
Ana Cláudia – Conta pra gente um pouquinho sobre a criação das imagens para a Ave? Adoramos tudo o que você desenhou pra gente… e claro, qual dos desenhos para a Ave é o seu favorito?
Alice: Foi um prazer fazer os desenhos para a Ave com essa ligação bonita com os livros e o universo da literatura. O livro é um objeto que faz a gente viajar e imaginar o mundo cada vez mais de uma forma diferente e tentei fazer com que os desenhos seguissem pelo mesmo caminho, brincando com a ideia de que tudo é possível nesse meio e que só basta imaginar.
Meu desenho favorito é uma animação que fiz de uma menininha sentada em um planeta e com um livro nas mãos. O livro se abre por diversas vezes revelando segredos ali escondidos, revelando a natureza viva dos livros e a magia que reina dentro de cada um deles.
Ana Cláudia – As suas animações são mesmo mágicas Alice!! Aquela foi a primeira ilustração que postei em nosso instagram, também adoro! Querida, agora para terminar, você se lembra qual o primeiro livro que você leu? Ou pelo menos o primeiro livro que te marcou?
Alice: Eu aprendi a ler e a escrever muito cedo, fui alfabetizada com três anos de idade pela minha mãe e lembro de muitos livros que passaram pelas minhas mãos e que me encantaram. Mas acredito que o primeiro livro que tive a oportunidade de ler inteiro e sozinha foi a A pequena vendedora de fósforos do Hans Christian Andersen. Eu ficava encantada pelas figuras e pela narrativa que se seguia com o virar das páginas, e eu acreditava e ainda acredito muito que tudo que sai de dentro de um livro é absurdamente mágico.
Ana Cláudia – Ah que conversa deliciosa! Muito obrigada pelo carinho e pela atenção querida Alice! Essa casa aqui é sempre sua!
Alice: Agradeço a Ave e a você, Ana, pela oportunidade, foi um prazer participar dessa entrevista e responder as perguntas, pois acabo revisitando essas memórias que para mim são muito importantes e pensando nas coisas que acredito para passar para frente. Espero que algumas dessas informações sejam úteis para quem assim como eu ama a arte e que de alguma forma deseja seguir o mesmo caminho. Um grande beijo para todo mundo!
Para conhecer um pouco mais da Alice, clique no link “Artistas”.
Alice, que bonita trajetória. Desenhar como herança de família, que coisa mais inspiradora!